terça-feira, 12 de agosto de 2014

Ele quer fazer parte dela

Acontece de um homem querer fazer parte da vida de uma mulher. Ele não percebe isto, com esta clareza. A um aceno ou pequeno gesto dela, ele a cerca. Escuta-a infinitamente. Pensa poder fazer tudo para ajudá-la. Não a espera pedir, nem sentir necessidade: adianta-se a ela. No filme Homens Brancos Não Sabem Enterrar (White Men Can't Jump, Ron Shelton, 1992) a personagem de Rosie Perez, na cama com o de Woody Harrelson, comenta que está com a boca seca. Woody levanta-se, e ela briga: "eu disse que estava com a boca seca, não pedi para você pegar água para mim". Por que o homem quer fazer as coisas pela mulher? Ele é um órfão da placenta, doido para voltar a participar da mulher. Ele se cansa, suporta situações ruins, para ter uma nova chance de se sentir junto dela. Gosta de um pouco de resistência. Gosta quando, após isso, ela se abre para que ele tente agradá-la com carícias e preenchimentos. É engolido e cuspido. Se ela mostra estar gostando, ele se sente no melhor dos mundos. Não, ele volta a pertencer a um mundo. Ela o abraça e ele acolhe quem o acolheu. Mas ele não aguenta muito tempo de conchinha ou de abraço deitado, e vira para o outro lado. O homem é um ser desgarrado à procura de uma carne quente e úmida. As situações difíceis, ele diz que não são nada. Se ele é recompensado, ótimo. Com o prosseguimento da relação, o corpo da mulher já não é novidade. Ele agora espera ser aceito pelas ideias que tem, pelas coisas que faz ou pelo dinheiro que pode levantar. Desde o começo ele mostrou essas coisas. Não importava se as ideias não combinavam. A profissão era melhorada pela conversa, ou inventava-se alguma ocupação. O dinheiro servia a um gasto bem calculado, atendendo ao mínimo e dando um luxo por noite. Ela nem pedia, ele que fazia questão de mostrar. Aos poucos, o luxo ia deixando de existir. A profissão parecendo pouco promissora. Mas, a esta altura, ele já fora aceito, entrou no coração, no corpo dela. As amigas aprovam-no, e o sogro não inspira vergonha. Ela então reclama daquelas outras coisas, mais e mais. Diz que ele não tem o bastante para ser aceito. Ele pula em cima dela, mas depois a insuficiência dele volta a ser falada. Ele percebe que é interessante para outras mulheres. Troca de mulher, ou mantém a que acha que tem. Pode passar a vida inteira ouvindo que é insuficiente, encontrando um conforto no sofá, no chefe, nos amigos, ou na própria mulher que, afinal, precisa fazer sexo. Pode ser uma boa ideia terminar uma relação, ou parar de investir naquela nova mulher, ou, ainda, parar de visitar a ex-namorada. São ideias que vêm, após ele perceber que ele mesmo está querendo é participar, não deixar que a vida da mulher, tão interessante, passe sem ele. Ele torna-se capaz de sair correndo da casa dela. Mas se ela chamar, ele resiste?

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