quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Intimidade e privacidade


Intimidade é o que fazemos dentro do quarto. Privacidade, dentro do banheiro. O que faço na intimidade, quero mostrar para alguém, seja para o BBB, seja para a pessoa amada. Quero mostrar o que faço no quarto, seja sexo, sono ou experimentação de roupa, pois estas são ações em que vejo imprimida minha identidade. Tenho meu estilo sexual, meu jeito de dormir e meu gosto distribuído em cada peça de roupa. Considero meu desempenho, a forma com que sou cuidadoso, audacioso, enérgico ou sutil, em cada ação que compõe o sexo, o sono e o experimentar de roupa, digno de ser notado e elogiado. Aceitamos sugestões de melhora, lógico, vindas da pessoa amada.

No banheiro fazemos o que todos os homens, e os animais mais próximos, fazem, que é defecar e higiene pessoal. Não consideramos que estes hábitos possam ser compartilhados com outra pessoa. Consideramo-os primitivos e sujos. Bem, no sexo também exibimos animalidade e secreções mas, neste contexto, eles são isso mesmo, exibições. São intercorrências do sexo que aproveitamos para incrementá-lo.

O sujo e o baixo do homem no que é feito no banheiro, embora sejam tão cheios de cultura quanto é o sexo, são respostas a necessidades de descarte e limpeza. Quanto mais imperiosas são as necessidades, menos controle temos sobre elas, mais à mercê delas estamos. Em uma guerra, venceríamos se fizéssemos sexo com o comandante adversário ("a posição em que Napoleão perdeu a guerra" parece o único modo em que o encontraram vulnerável); não correríamos perigo ao dormir, que seria no mesmo horário dele; terrível seria sermos pegos de calças curtas, tropeçando e nos sujando.

Um amor verdadeiro quer ver seu strip no quarto e a cueca que você escolheu, mas te deixa em paz quando você vai ao banheiro. Ele nem pensa no que você faz lá, pois te preserva.

Peter Gay, no prefácio da biografia de Freud, de sua autoria, conta que o biografado fez de tudo para destruir o material que poderia oferecer a futuros biógrafos seus. Os biógrafos deveriam se esforçar para adentrar a intimidade do grande mestre da intimidade do homem. Ninguém mais senão Freud poderia fazer a análise de Freud, conhecer sua intimidade.

Freud, no entanto, se sabia um importantíssimo homem, inevitável personagem de futuros escritos. Desejava este reconhecimento, embora tardio. O preço, porém, era que tivesse seus rastros farejados. Fotos, cartas de amor, papéis amassados, elementos íntimos jogados fora, marcas, enfim, das coisas que ele quis se livrar, dejetos, Anna Freud os pegou do lixo e mostrou ao mundo.

Freud não está mais disponível para mostrar ou não sua intimidade. Então o que lhe é privado tornou-se público, à sua revelia.

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