quarta-feira, 11 de novembro de 2015

O adulto e a criança (ou: o que é absurdo no caso do menino que quebrou a escola)



Um vídeo recentemente divulgado (http://g1.globo.com/rj/regiao-dos-lagos/noticia/2015/10/mae-diz-que-vai-acionar-justica-contra-escola-onde-filho-foi-filmado.html) mostrou um garoto pondo abaixo uma sala de sua escola. Os funcionários olhavam, alguns se aproximavam e puxavam-no, ao que a pessoa que filmava dizia para que o deixasse fazer o que quisesse, pois estava sendo filmado. Na internet, muitos disseram que punição física mudaria aquele comportamento.

O garoto ameaçava derrubar uma estante, sob o som de pedidos de socorro aos bombeiros. Antes de se falar em bombeiros, chegou-se a falar em polícia, mas deixaram esta ideia de lado, pois com ela ficaria por demais claro que os observadores, à medida em que se faziam observadores e gritadores, transformavam o menino em homem. Com um menino tenta-se falar, no limite, gritar ou puxar pelo braço. Contra um homem não se faz nada, só pedir socorro.

A escola está colapsada: não existe qualquer estrutura didática com pessoas fazendo bico como professores (a 9 reais a hora aula, é assim), não tendo qualificação para buscar um melhor emprego, fazendo a função de observar o banho de sol e o encarceramento de crianças e jovens. Crianças e jovens são largados, no interior da escola. Ninguém os assume, e eles reproduzem muito do que fazem na rua.

Meninos desenvolvem o senso de que, naquela socialização, eles devem ser "donos do pedaço", quer dizer, cada menino deve se apresentar não como responsável por si mesmo (o que já seria absurdo), mas como senhor territorial, dividindo esta função com outros integrantes de seus grupos, e apresentando, neste ambiente, uma atitude para que tudo ande conforme o que eles querem. Não há contraponto educativo para o que eles querem, o que lhes ensinaria a desenvolver a senhoria de si mesmos. Há o contraponto violento, mantido esfriado, mas com episódios quentes, de enfrentamento.

O respeito está todo com esses meninos, não com os adultos, incapacitados, que os assistem, como crianças. O abandono desses meninos na escola, nas ruas, em casa, o fato de não terem quem os assuma, os ame e deles exija coisas, é o que os deixa em situação de terem que ser homens. Os adultos, as verdadeiras crianças nesta história, chamam um pai punitivo: o pai da criança e o policial devem exercer extrema violência.

Os adultos viram a destruição do seu lugar de educadores. Nada elevado como a educação se apresenta mais à mão, como se a civilização tivesse acabado e precisasse ser reconstruída. Em nossa tribo ancestral, dita por Freud, os homens queriam matar uns aos outros e roubar suas mulheres. O indivíduo mais forte impedia a ocorrência disto, sob pena de morte. Os demais formaram um grupo que matou este mais forte, mas logo viram que se destruiriam mutuamente se se deixassem viver sem regulamentos sociais. Ergueram um totem, à imagem do líder morto, de onde se acreditava emanar esses regulamentos.

A lei que reprime a violência e a sexualidade desmedidas era observada por todos, e aplicada por indivíduos especialmente encarregados, e que não podem se exceder, não podem ser tiranos. Ninguém pode ser tirano, a punição deve ser bem aplicada. A aposta principal da nossa civilização é a educação. Se por ventura ela vai mal, ela é corrigida, não se chama a punição extra-escolar para ensinar o que é para ela ensinar. Até mesmo porque, punição extra-escolar não é educação, pois educação é direcionamento de impulsos, não simples repressão.

A fala "uma escola aberta é uma cadeia fechada" é fruto da ausência deste modelo civilizacional descrito por mim: no horizonte, o que se vê é antes a punição do que a educação. Este olhar é o que a sociedade-criança lança ao pobre, aquele que já nasce homem perigoso. Queremos que o governo cuide de tudo, como um pai em cujas mãos está a nossa segurança e encaminhamento. Conversar com ele a respeito desses assuntos, apresentar os próprios interesses e melhorá-lo, enquanto governo, está totalmente fora de alcance, para o povo-criança.

O fim da escola ocorre junto do fim da civilização.

Nenhum comentário:

Postar um comentário