quarta-feira, 16 de março de 2016

A festa do sangue e os intelectuais vazios


Lula é um bestializado. Moro é inibido, portanto, civilizado. Ele é quem estava com a tarefa de apontar a bestialidade de Lula. A tv e as pessoas, na internet, mostraram a capacidade de Lula em esbravejar contra Moro, e em falar palavrões em conversas telefônicas.

Está se formando um sentido de Lula como xingador, atiçador de ânimos e bárbaro. Todos estão contribuindo para isso, inclusive ele mesmo. Inclusive, também, a militância que lhe é favorável, defendendo as ações dele como necessárias. A bestialidade de Lula é acompanhada da bestialidade de quem o assiste, atacando-o ou não.

Não somos mais espectadores de gladiadores. Falando com Sloterdijk, a partir do livro Regras para o Parque Humano, temos nos criado com extensivo uso de mídias desinibidoras: é imperioso fazermos vídeos, contando nossas vidas, apresentarmo-nos como especialistas de algo e capazes de dar opinião sobre qualquer coisa.

"Ame ou odeie". Recebendo likes, o personagem do vídeo sorri. Quando o público se queixa ou, mais, aproveitando o clima de desinibição, insulta o personagem do vídeo, este esbraveja. O like e o dislike regulam a inibição e a desinibição, a civilização e bestialização.

O que foi central em nossa humanização, ou melhor, em nossa capacidade de autocontenção, que foi a cultura dos livros, deixamos para escanteio. Durante um tempo fomos amigos de grandes autores, essas personalidades ricas e com narrativas que despertavam amor e esperança. Levávamos um longo tempo nos formando, até dizermos algo. E a um acontecimento concedíamos tempo para ser pensado. Não nos atirávamos. O intelectual é conhecido por ser auto-contido.

Hoje reuniram-se na PUC de São Paulo intelectuais e artistas para, sentados em suas poltronas, pensar (http://oglobo.globo.com/…/intelectuais-de-esquerda-fazem-at…). Eles são os contrários à disputa de força entre o aguilhão da justiça e o esbravejamento de Lula. Querem que isto tudo pare, e que o bestializado Lula possa se recompor e parar de esbravejar. Mas, se isto acontecesse, se a justiça parasse de perseguir Lula, o aparelhamento que o PT fez no Estado não seria dissolvido.

A inibição destes intelectuais é um silêncio auto-imposto diante de Lula. Eles não podem sequer pensar em admitir que Lula deu algo à população pobre, enquanto deu algo também a si mesmo, pois ele se vê como um desses pobres. O melhor pobre, diga-se, pois comanda os outros. Lula é o que deve receber mais recompensas, por ter sido desinibido o bastante para andar no meio da multidão e dar dinheiro.

Os intelectuais que se reuniram na PUC têm o Lula como um ingênuo de bom coração, uma criança bestializada que ajuda os outros e faz umas pirraças quando brigam com ele. Não há reflexão, aqui, sobre se as ações de Lula e do governo são favoráveis à democracia e ao liberalismo, que nos são caros. Será que ainda nos são caros?

O que sabemos desses ideais, se trocamos a educação pelo espetáculo de sangue que envolve o militante pró-Lula e o militante anti-Lula? E se eles são assistidos por intelectuais que fingem cautela reflexiva, para disfarçar a incapacidade de se desinibirem, solicitarem explicações do governo, a partir de honesta observação e boa reflexão?

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