quinta-feira, 31 de março de 2016

Crime e castigo


O pai primevo possuía todas mulheres da sua horda. Os outros machos, no despontar da maturidade sexual, eram expulsos. Um dia, esses machos se uniram e mataram o pai da horda. Parecia-lhes que agora poderiam viver livremente seus impulsos sexuais. No entanto, a satisfação do impulso de um implicaria na disputa de fêmeas com outro macho da horda.

Nenhum deles era tão poderoso quanto o pai, a ponto de poderem sobrepujar o poder dos outros. Eles se igualavam em força. Em nome da convivência social, cada um abriu mão da fruição das mulheres da horda, e também da possibilidade de agressão contra os demais. O tabu do incesto foi estabelecido como preceito fundamental. Outro preceito era a proteção ao totem, um pacto para que ele também protegesse a horda.

Freud explica que o filho sente ódio contra o pai, por este possuir o primeiro objeto de amor dele, a mãe. Este pai, eventualmente, sofre algum acidente e se machuca, ou então viaja por uns dias. O filho sente que seus desejos de morte contra ele se realizaram, e os reprime, torna-os inconscientes. Sente-se culpado.

Em tribos indígenas, quando um guerreiro matava um guerreiro de outra tribo, passava por um período de purificação. Acreditava-se que o espírito do morto iria querer se vingar. O assassino, então, chorava aquela morte, e afirmava, em orações, estar pranteando a alma do morto, mas que ela, malévola, vinha lhe assediar.

O mal que a criança desejou ao pai, viu realizar-se e foi reprimido, é lançado para o exterior, como um fantasma que vem de fora para o atormentar. Os desejos que nos são mais caros, como o sexual e o agressivo, são aqueles que mais reprimimos.

O totem foi uma primeira objetivação da lei e da punição que lançamos contra nós mesmos. Para esta lei, contudo, o homem não havia criado um texto, uma mitologia explicativa. Era um representante externo de uma força misteriosa que guardava a horda, ordenava a que seus membros obedecessem a ritos, e os punia, quando infringiam aos preceitos fundamentais.

Na fase animista, da humanidade, o homem sentia que punição a uma infração ocorreria imediatamente após o ato. Onipotente no pensamento, acreditava que seu pensamento podia criar tanto a situação de satisfação sexual, quanto realizaria a sua punição. A ausência de uma narrativa explicadora da lei e da punição, do totem, dificultava ao homem que as percebesse como projeções dele mesmo.

Na fase religiosa, as narrativas mitológicas dos deuses confere uma maior objetividade a estas leis e punições. Foi Deus quem mandou que eu me comportasse de determinada forma, e ele tem características de justiça e enorme poder, que se atestam pelas muitas histórias presentes na tradição. Esta mitologia permite ao homem sentir que a lei e a punição não emergem dele mesmo, embora, do ponto de vista da psicanálise, tenhamos que relembrar que os deuses são mantidos pelo homem por sua necessidade de proteção, inclusive (ou principalmente) contra os impulsos dele mesmo.

Vivemos na fase da razão científica, em que ao homem é dito o seu lugar dentre outras espécies, e do seu planeta no universo. O poder de cada um sobre os outros e sobre si mesmo é limitado. O homem não pode dispor livremente da vida e da morte. Para garantir isto, as leis religiosas quanto a agressividade e o sexo inspiram nossa moderna legislação civil, e também às normais culturais.

A obediência a estes preceitos é aprendida desde cedo, pelo indivíduo. Algo que façamos de errado vêm-nos como consciência culpada. O cidadão satisfaz sua agressividade nelas, e pode deixar o ódio no inconsciente. E também nelas projeta o seu amor, idealiza que ao segui-las tudo andará bem. Mas, mesmo que as leis e punições estejam algumas codificadas, outras transformadas em tradições, a ação errada que cometemos vêm-nos como um fantasma subjetivo. A sentença de um juiz é acompanhada de auto-culpabilização.

Entretanto, o sentenciado pode passar por algo diverso, e sentir-se perseguido pela lei. Ele projetou todo o mal que cometeu para fora, de modo a não ser perturbado subjetivamente por ele. Neste caso, a lei objetiva é má, e ele próprio é bom. A consciência dele é ocupada por sentimentos amorosos a respeito de si mesmo. É a vontade dele mesmo que ele procurará seguir.


P.s.: Texto elaborado a partir do livro "Totem e Tabu", de Sigmund Freud.

Um comentário:

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