segunda-feira, 7 de julho de 2014

Alive and kicking

Uma tampinha, uma semente, uma mancha no chão da rua. Prepara a aproximação com jeito. Aquelas belezinhas só esperando o pé. Conhecidas, na marca e na necessidade de tal pegada no chute. Não vá errar. Acréscimo meu ao "Afinação da arte de chutar tampinhas", conto de João Antônio. As peladas viraram esporte, que viraram show. O cara atento ao que aparece, driblando e aprimorando sua arte, seu mandar bem, fica atordoado com os milhões de reais, telespectadores, erres do Galvão e câmeras. O futebol, assim como as outras coisas populares, são da necessidade do corpo que cruza a cidade, vê e aparece, ali, rés do chão. Nos 70 lembraram-nos que fazemos parte de 90 milhões. O público deveria animar a seleção e animar-se de Brasil. A cola era o "ame-o ou deixe-o". O chutador de repente era brasileiro e amante do Brasil. Um exército sem heróis torcendo para uma seleção de heróis que nada tinham a ver com o Estado-sociedade. Sloterdijk fala sobre a arma de fogo criadora do heroísmo à distância, heroísmo covarde, e destituidora de qualquer valor para o soldado no front. Éramos pé-rapados em marcha. A música da nova Copa diz para amarrarmos o amor na chuteira. Nosso fazer melhor está nos pés, viemos de baixo e estamos para construir uma democracia, um mercado, dizendo, petulantemente, que os do poder não me representam (é assim que dizemos, "me", mesmo formando uma multidão. Não estamos no "nós"). Mas de novo querem nos atribuir um amor que ate-nos em um "nós brasileiros", a ser doado aos onze em campo, em um jogo que não é o que está nos preocupando, emocionando e exigindo arte. Nossa briga está no espantar-se com a Lei Geral da Copa, o indignar-se com os candidatos a governador, que teremos para escolher, e o ir pra rua aprimorar a arte do chute. Aparecem na minha frente, dizendo que sou brasileiro torcedor do maior do mundo. Respondo não. Sou daqui, mesmo. E a FIFA não é tudo, nem a dona dos meus pés.

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