terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Para ler Platão



Peter Gay conta que Freud, anti-metafísico, ao ser acusado, pelos seus colegas médicos, de sempre apelar à “causa sexual”, dizia que seu Eros era como o de Platão. Platão é o criador do gênero literário chamado filosofia (lembra-nos Paulo Ghiraldelli Jr.): um relato das investigações em torno de um problema, buscando suas causas e razões. Os textos de Platão, contudo, apresentam imagens, cenas e personagens inspiradores dentro e fora da filosofia. Participantes de outros gêneros literários, como por exemplo a ciência, a ficção, os ensaios, etc, que sejam cultos, ou seja, que tenham lido Platão, assumem como eternas provocações imagens como a do Anel de Giges, cenas como a do encômio de Alcibíades a Sócrates, ao final do Banquete, e o comportamento e as falas de Sócrates. Em relação a estes elementos, permanece a sensação de que temos algo a descobrir e, por essa descoberta, se conversa, se escreve, intermitentemente, e por uma vida.

Um clássico dá a sensação que a própria vida que se tem seria bem usada nesse trabalho em torno dele. Sempre dá vontade de abrir um grupo para ler Platão. Quem é dado a isso não diz “reler”, mas ler, justamente porque a leitura trará coisas novas, e o pedido para que seja em grupo serve para garantir que a própria pessoa que pretende ler não faça uma leitura repetida, não pense as mesmas coisas... não por culpa do texto, mas de uma falha da própria pessoa, que pode não conseguir se inspirar por algo que é sumamente inspirador.

Freud se inspirou em Roma, com Michelangelo e os renascentistas. A Roma católica inspirou a sua aversão. Lou Andreas Salomé o fascinou, embora ele, pelo avançado da idade, não tivesse mais potência sexual. As boas sensações são curtidas, Freud se aproximava delas. O apaixonado de Platão é o arrebatado, que se torna ao mesmo tempo devoto enlouquecido, cuja sublime condição eleva sua alma a alturas impensáveis, faz o homem transcender a si mesmo. Todos os que sentem, os que ainda têm sensibilidade, e têm a imaginação se desenvolvendo a partir dela, são amigos de Platão. Mesmo que sejam neurologistas-psicólogos, ou filósofos pragmatistas: se são suficientemente cultos e apaixonados, volta e meia estão com o braço por sobre os ombros de Platão, para ouvir suas histórias sobre o amor.

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