segunda-feira, 15 de junho de 2015

“Brasil, pátria educadora”



No filme Gran Torino, o jovem asiático era assediado pelo primo mais velho para que entrasse em sua gang. O garoto não encontrava muitas perspectivas para o futuro, e tinha tudo para repetir a trajetória de roubos, drogas e violência, do primo. Ao lado de sua casa morava um velho rabugento (Clint Eastwood), com desprezo pelos asiáticos, e um desprezo especial pela velha avó do garoto. O garoto começou a se oferecer para cortar a grama, consertar a calha e lavar o Gran Torino do vizinho. O veho começou a demandar dele serviços mais difíceis. Após alguns trabalhos bem-feitos, o vizinho levou o garoto para a barbearia, para aprender a falar feito homem; levou-o também à loja de ferramentas, pois um homem de bem precisa ter suas próprias ferramentas, e não mais ficar pegando emprestadas as dos outros.

Na escola, a criança e o jovem entram em relações interpessoais com os outros da mesma idade, e com a professora, e a partir destas relações desenvolvem uma disciplina ou um comportamento que permite o conhecimento e a contenção da própria vontade, além do aprendizado e do raciocínio sobre conceitos e questões morais. A criança recebe o adulto interessado em relacionar-se com ela, em ser de sua confiança e estima, então é levada a aprender. Fora da escola, e quando já se é jovem, o aprendizado ocorre antes da relação. O saber fazer é requerido, e não se recebe nenhum elogio anteriormente ao desempenho.

Seguindo pela teoria da alma constante no Fedro, de Platão, o jovem gostaria de ser acolhido pelo adulto, mas uma parte de sua alma o obriga a se conter, como se ainda não houvesse chegado o momento da acolhida. Ele precisa esperar este momento ou, antes, merecer a chegada dele. Na pederastia grega, um jovem aprendia um ofício com um homem. Era por ele introduzido na vida da pólis, no círculo social que completaria o trabalho de fazer dele homem, cidadão. A pederastia também era uma relação de namoro. Entre Alcibíades e Sócrates, o segundo não apenas ensinou ao primeiro que ele não sabia o que imaginava saber, indicando o que ele precisava para ser um governante, como ensinou-o a conter seu impulso amoroso e a esperar a hora certa.

Hoje não existe mais a cultura de se ter um aprendiz ou um mestre. Quando um jovem encontra um adulto antes ouve ameaças que aviltam sua dignidade, rebaixando-o e às vezes revoltando-o, do que orientações e instigações que o façam buscar se superar e orgulhar-se de si mesmo. “A vida ensina na porrada”, é o que alguns pais dizem. Fora da escola, o adulto é hostil para com o jovem, que tem impulsos e força. Dos professores, a sociedade espera alguém abaixo da capacidade de sentir hostilidade: o professor é alguém que, de tanto pedir e não receber, cansou de esperar pelo momento da recompensa. Depois, começou a achar que não merece qualquer recompensa, seja amorosa ou material (pagar bem ao professor significaria que se os ama). Ao contrário de honra, o professor sente vergonha.
Não gostamos, por isso não educamos, tanto os jovens quanto os professores. Não exigimos deles, nunca os recompensamos. Tornamos-nos um país com indivíduos que não enfrentam dificuldades utilizando o empenho e o raciocínio, mas usam o jeitinho e os acordos facilitadores. O que fazemos sempre tende a descambar para a ilegalidade. A casa não ensina, a escola não ensina, não mais nos educamos mutuamente, resta para a pátria ser educadora. A pátria pode ser a seleção de futebol. Pode ser o batalhão choque. Estas são as formas como vemos a pátria em nosso dia a dia. É assim que ela nos educa, pais, jovens e professores.

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